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Monday, March 13, 2006

Crítica de Cinema - Capote

"It´s like we grew up on the same house, one day i left thru the front door and he left thru the back door"

Por vezes basta um momento, uma acção, um pouco de sorte ou azar para a nossa vida tomar um rumo completamente diferente. Woody Allen explorou isso recentemente no excelente "Match Point". É certo que a vida nunca volta atrás. Pode haver remorsos nas nossas opções mas nunca se pode voltar atrás. É necessário viver com as consequências das nossas acções. E por vezes são de uma intensidade muito elevada.
Foi isso que aconteceu com Richard Hickock e Perry Smith naquele dia fatídico de 1959, em Halcomb (Kansas), quando assassinaram uma família inteira de quatro para roubar uns míseros dólares. Foi o momento que definiu as vidas deles mas não somente deles. Truman Capote foi o terceiro condenado à morte de Halcomb.

A história acompanha a vida de Truman Capote (Phillip Seymour Hoffman -um dos grande actores de Holywood) durante a escrita da sua obra prima de não ficção (como ele lhe gostava de chamar) "In Cold Blood" - A Sangue Frio.
Em 1959, e após tomar conhecimento dos assassínios de Halcomb decide deslocar-se, de New York até ao Kansas em processo de investigação para escrever um artigo para um jornal. Segue acompanhado de Harper Lee (interpretada por Catherine Keener – num papel de contenção e composição de muita qualidade), como ponte de primeiro contacto com os habitantes do interior americano. É que, realmente, Capote não era uma pessoa fácil. Era uma pessoa que deixa um sentimento de desconfiança numa primeira impressão. Isto, ainda mais, falando de uma pequena terra do interior. Mas, com excepção de alguns inimigos de estimação personalizados pelo detective Dewey (Chris Copper, sempre em grande, desta vez no papel de um detective de província homofóbico- o homem faz de tudo)., consegue conquistar a terra e decide escrever um livro uma vez que o material é muito e de grande qualidade.
Cria uma relação de profunda amizade, com fenómenos de vampirismo interesseiro associados o que lhe provoca um grave conflito na sua mente (e do qual nunca irá recuperar). É como um vampiro que suga um corpo até à ultíma gota e quando o sangue acaba chora.
Ele sabe que o exíto do seu livro depende de Perry Smith. Não o pode terminar sem ele. Por muito que se considere um escritor de grande qualidade sabe que não o pode terminar sozinho. É uma relação muito complexa de amizade (dizia-se de algo mais mas nunca foi provado), que se cria com Perry Smith (Clifton Collins Jr., outro secundário de luxo, demasiado ignorado nos prémios de interpretação por esse mundo for a, mas o nome ainda conta muito) e que num intervalo de 6 anos permite a Capote criar a sua obra prima.

Fala-se de secundários de luxo, porque o filme gira todo em volta de Capote, ou seja em volta de Hoffman. Uma interpretação verdadeiramente memorável, carregando o filme às costas. Não conheci Truman Capote (que se diz, ainda era mais exagerado nos seus maneirismos visuais e convencido na sua capacidade como escritor), mas fico com uma ideia do homem que Hoffman interpretou à sua maneira. Mais comedido e por isso, talvez, tornando-o também mais humano. No entanto, é negativo para o filme, uma vez que abafa um pouco as interpretações que apesar de brilhantes, não brilham o suficiente. Mas isto já é o problema de estrutura, na análise de uma personagem tão marcante na história e do qual nunca se livrará.

Bennett Miller também merece referência, uma vez que foge dos clichés, agora em moda, do biopic. Em vez de retratar toda a vida de Capote, decide-se por um momento, obviamente pelo seu momento mais inspirado e que determinou, a partir desse momento, o caminho a que o destinou. A elegância das imagens e uma reconstituição de época eficaz (não tem os valores de produção de “Munique”, mas disfarça muito bem) com o uso de locais isolados e sets (como na prisão, dentro de casas) e evitando grandes aglomerados ou exteriores, que significariam um aumento brutal nas despesas. Aí está patente a sua inteligência como realizador, de futuro sem dúvida.
Falha no entanto, no crescendo de tensão até ao enforcamento de ambos os assassinos em 1966, após uma tonelada de recursos. Não se sente. É apenas o culminar do filme. Que se arrasta até ao fim após os enforcamentos. Não faz sentido a continuação a partir deste momento. O final deixa também tudo em aberto, que apesar de ser lógico deixa um vazio no filme, que é apenas preenchido com a frase que Truman Capote nunca mais terminou um livro e morreu em 1984 devido a complicações com o alcool. Mas isso já é para outra história. Ela que venha (se calhar mais cedo do que o pensado).
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Nota do Filme - Capote - 6/10

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